Ex-deputado federal e ex-ministro do Trabalho nos governos dos ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, Carlos Lupi esteve em Ribeirão Preto para um encontro regional do Partido Democrático Brasileiro (PDT) que ele preside desde 2012. A meta é fazer o partido ser protagonista em muitas cidades nas eleições municipais do próximo ano.Em entrevista ao Tribuna, ele revelou que o partido quer ter candidato a prefeito em Ribeirão e que o nome preferido é o do vereador Lincoln Fernandes, atual presidente da Câmara de Vereadores. Sobre o governo do presidente Jair Bolsonaro afirmou que o brasileiro comprou ‘este produto pela internet’ e agora que quando foi entregue, notou que veio com defeitos e não era o que ele esperava.
Tribuna – Em 2016 nas eleições municipais o PDT teve candidatura própria para prefeito em Ribeirão Preto, o ex-vereador Ricardo Silva.
Carlos Lupi – Mas depois ele saiu do PDT e foi para outro partido. Sou um contador de histórias e vou exemplificar a saída dele com uma história que minha avó contava. Quando eu era criança ela morava em uma dessas casinhas típicas de vila no Rio de Janeiro. A casa dela ficava numa ladeira, em um nível inferior ao da rua. Para chegar à rua era preciso subir uma escada muito grande e sempre que alguém que passava pela ladeira e cumprimentava minha avó ela dizia: “Vai com Deus”. Algumas vezes ela dizia essa frase com carinho e outras vezes com indignação.
Tribuna – …E isso quer dizer….
Carlos Lupi – Vou explicar. Depois de ouvir muitas vezes ela dizendo esta frase resolvi perguntar por que para uns ela a dizia com carinho e, para outros, ela falava com raiva. Aí, ela me respondeu: “Quando falo com raiva estou me referindo aos inimigos. Que Deus leve eles logo”. Contei essa história para dizer: Que ele vá com Deus.
Tribuna – Mas o senhor diz “vai com Deus” com indignação ou com sentimento de afeto?
Carlos Lupi – (Risos) Ele não é inimigo, mas que vá com Deus.
Tribuna – Nas próximas eleições o PDT pretende ter candidato próprio ao Palácio Rio Branco?
Carlos Lupi – Pretendemos e precisamos ter. Temos e defendemos um projeto nacional que o nosso candidato a presidente nas eleições do ano passado, o Ciro Gomes, já mostrou para o Brasil. Queremos nos diferenciar e, por isso, fincamos nossas metas no desenvolvimento do país, seja na educação, na geração de empregos e na geração de renda. Lutamos para o fortalecimento da indústria e na defesa da educação de tempo integral. Tive o privilégio de trabalhar com o educador Darcy Ribeiro que elaborou a Lei de Diretrizes e Bases para a Educação no Brasil e com o ex-governador Leonel Brizola. Eles diziam que só a educação liberta o povo. Buscamos essas metas, mas para construirmos 2022 temos que começar com 2020.
Tribuna – Esse projeto passa por candidaturas para prefeitos no maior número de cidades possíveis?
Carlos Lupi – Com certeza. Em Ribeirão Preto queremos viabilizar a candidatura do vereador Lincoln Fernandes. Ele é, de fato, um nome novo na política. O Bolsonaro não significa o novo. Tem 64 anos de idade e foi deputado por 28 anos. Todos seus filhos estão na vida política há anos e ele não representa o novo.
Tribuna – E em Ribeirão Preto?
Carlos Lupi – Aqui em Ribeirão Preto, o Lincoln, um rapaz que trabalha desde os onze anos de idade, se tornou vereador e conseguiu em seu primeiro mandato ser presidente de uma Câmara de vereadores, representa o novo na política. Essas conquistas mostram o poder de articulação dele, porque não é fácil, no primeiro mandato, conseguir ser presidente do Legislativo de uma cidade do tamanho de Ribeirão. Além de ter quase setecentos mil habitantes é a capital de toda uma região. Ele ainda está no charme dele, mas vou continuar insistindo para ser nosso candidato.
Tribuna – Em relação ao governo federal, o PDT é oposição em tempo integral?
Carlos Lupi – Somos oposição, mas propositiva. Por exemplo, em relação à reforma da Previdência discordamos da proposta do governo, mas apresentamos a nossa. Em todas as propostas que o governo apresentar, e que formos contra, vamos mostrar a nossa posição e como faríamos aquilo se fossemos governo. Para resumir, no caso da reforma da Previdência quando o governo estabelece 40 anos de contribuição, ele está punindo o trabalhador e dificilmente alguém conseguirá se aposentar. Em média, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, para que alguém consiga estes quarenta anos de contribuição precisará trabalhar em media 53 anos em função do tempo – intervalos – que ele fica desempregado ou trabalhar sem registro. Se uma pessoa começa a contribuir aos 18 anos de idade acabará se aposentando com 71 anos de idade. Isso significa que como a média de vida do brasileiro é 75 anos de idade, regra geral, ele ficará aposentado apenas quatro anos antes de morrer.
Tribuna – E em relação ao Judiciário, a reforma é satisfatória?
Carlos Lupi – Ela não está mexendo com o Judiciário nem com os penduricalhos existentes, como o auxílio dormitório. Também não mexe com quem está nas empresas públicas e ganha mais que o teto do presidente da República. Tem juiz que ganha R$ 260 mil por mês com todos os penduricalhos. Pergunto: a reforma está mexendo e acabando com estes privilégios? Não. Na verdade mexe apenas com a parte mais frágil da sociedade.
Tribuna – Em sua opinião haverá mudanças na proposta encaminhada pelo Governo?
Carlos Lupi – Com certeza. Eles não conseguirão aprová-la do jeito que está. Vai ser uma luta difícil a que estamos travando, mas vamos vencer.
Tribuna – Na área educacional como o senhor avalia as propostas do atual governo?
Carlos Lupi – Fui relator na Câmara dos Deputados da Lei de Diretrizes e Bases da Educação e acho muito ruim a proposta do governo. Eles têm uma visão policialesca e quer doutrinar as pessoas. A educação tem que ser livre e nenhuma nação do mundo foi construída com paradigma educacional de censura. A escola tem que ser livre e o aluno deve discutir o que quiser, desde a droga e até sexualidade. Se ele não discutir isso na sala de aula, vai aprender onde? Na rua? A sociedade está andando para frente e a proposta educacional do atual governo caminhando para trás.
Tribuna – O senhor é do Rio de Janeiro um estado com grandes problemas na área de segurança. Facilitar que a população tenha uma arma é algo benéfico?
Carlos Lupi – O Rio é uma espécie de síntese do país e tem como característica ser muito aberto para todos os brasileiros. Se o combate a violência passar pelo aumento do armamento estaremos perdidos, pois o cidadão de bem, que tem que trabalhar para se sustentar, não terá como comprar arma e fazer cursos e treinamentos para usá-la. Já os bandidos, regra geral, são treinados para usar armas e para roubar, assaltar e matar. A polícia tem que ter capacidade – técnica e de recursos – para combater a criminalidade e vigiar, por exemplo, as fronteiras evitando a entrada de armas aqui. Armamento não resolve o problema de segurança pública.
Tribuna – Qual é o maior desafio para convencer a população das teses que o senhor defende?
Carlos Lupi – Apostamos na inteligência do povo brasileiro. Costumo dizer que o Bolsonaro foi um produto comprado pela internet. O povo viu e comprou. Mas passada a eleição, quando o produto chegou à casa dele, descobriu que não era o que havia comprado e que possuía defeitos. Posso estar enganado, mas as pesquisas que tenho visto confirmam isso. É inconcebível alguém que se diz cristão ser patrocinador do ódio, da divisão, das armas e da violência. Que cristão é esse?
Tribuna – Temas nacionais como educação e segurança devem influir nas eleições municipais do ano que vem?
Carlos Lupi – Acredito que é isso que o Bolsonaro quer. Ele tem uma fábrica de supérfluos muito grande. Enquanto ficamos discutindo a higiene do órgão sexual ele vende o Pré-Sal. Enquanto se discute se não utilizar a cadeirinha para o transporte de crianças nos veículos deve gerar multas, ele tenta passar as reformas do jeito dele. Essa técnica de desviar o foco é americana e utilizada para criar “cortinas de fumaças” para desviar atenção do povo. Eu aposto na defesa da inteligência do povo brasileiro.
Tribuna – O PDT é um partido antigo e com quarenta anos de fundação. Como conciliar esse passado com o que hoje é chamado de “o novo jeito de fazer política?”
Carlos Lupi – O novo não está no fato de ter pouco tempo de vida. O novo é permanecer honesto e não fazer disso uma bandeira ideológica. Quem é honesto não vende, porque quem é honesto apenas o é. Você acredita que ser honesto é tirar direitos dos trabalhadores? Não. Com certeza não é. Ser novo é defender o que defendemos como mexer no sistema financeiro e aumentar a taxação das grandes fortunas e fazer com que os bancos respeitem a Constituição que diz que as taxas de juros devem ser de no máximo 12%. O novo está na concepção de vida e não no tempo e na idade. Você pode ter dez anos de vida e ser velho e também pode ter 75 anos de vida e ter idéias novas. O governador Leonel Brizola morreu com 82 anos de idade e era um revolucionário.
Tribuna – A política é o principal instrumento para resolver os problemas do país?
Carlos Lupi – Temos que fazer da política um instrumento de transformação. Quando tentam demonizar os partidos políticos e tentar fazer o povo acreditar que todos os políticos são bandidos estão tentando beneficiar o capital. Isso é a política do pão e do circo que começou na idade medieval. A diferença de lá para o Brasil é que hoje temos apenas circo e está faltando o pão.