A cada 36 horas a secretaria municipal da Saúde de Ribeirão Preto perde um profissional dos mais variados setores e pelos mais diferentes motivos. Levantamento feito pelo Tribuna junto à Administração Municipal revela que de janeiro de 2018 a março de 2019, 385 profissionais se desligaram da Rede Municipal da Saúde. Média de um servidor a cada 36 horas. Os principais desligamentos são ocasionados por pedidos de aposentadoria, de exoneração e solicitação para trabalhar em outros setores da administração municipal. Atualmente a Rede Municipal de Saúde possui 2.923 servidores concursados.
Entender os motivos desta debandada não é algo difícil e tem dois motivos principais. O primeiro, ligado à aposentadoria que, neste período, somaram 305 pedidos naquela pasta e tem relação direta com as mudanças previstas na Reforma da Previdência em fase de discussão no Congresso Nacional. Com o temor de serem atingidos pelas novas regras, os servidores municipais com tempo de contribuição e idade mínima para se aposentar estão pedindo seus direitos. Vale lembrar que hoje em todos os setores da administração municipal existem cerca de mil servidores aptos para se aposentar.
Já o segundo motivo tem relação direta com o dia a dia do trabalho nas unidades de saúde que é considerado estressante em função do número de atendimentos realizados. Graças em parte ao que chamam de estresse profissional, entre janeiro do ano passado e março deste ano, 109 profissionais da área de enfermagem e 98 da área medica deixaram a Rede de Saúde.
Dados da secretaria revelam que cerca de 90% dos atendimentos dos prontos atendimentos deveriam ser feitos como consultas marcadas nas Unidades Básicas de Saúde. Para se ter uma ideia do que o governo chama de distorção no atendimento, a Rede Municipal produziu, em 2018, mais de 780 mil consultas de Pronto Atendimento, enquanto a projeção preconizada pelo Ministério da Saúde para uma população do tamanho da de Ribeirão Preto não deveria passar de 220 mil consultas deste tipo por ano, isto é, 560 mil atendimentos a mais ou 254,5% a mais do preconizado.
Um exemplo motivador do estresse nas unidades é resultado da relação entre o total de pacientes e o tempo de espera para ele serem atendidos, o que em vários casos, acaba resultando em discussões entre os pacientes e os servidores. Há um mês, por exemplo, o acompanhante de um paciente agrediu uma enfermeira, quebrou uma porta e um computador na Unidade Básica Distrital de Saúde (UBDS) do Quintino Facci II. Já na terça-feira 26 de março, uma mulher também se descontrolou, depois que uma paciente desmaiou na mesma unidade enquanto esperava atendimento.
Na época, o secretário municipal da Saúde, Sandro Scarpelini – atualmente afastado para tratamento de saúde – afirmou que quando um paciente arranca uma porta e joga em cima de um funcionário, perde totalmente a razão. “A conseqüência neste caso é que os funcionários começam a trabalhar em clima de terrorismo que provoca medo e faz com quem eles queiram se demitir”, disse. Ele destacou também que esses episódios de violência dificultam o recrutamento de novos funcionários, mas que a secretaria tem realizados concursos e viabilizado parceria com Organizações Sociais (OS) para administrar parte do setor. Como por exemplo, o processo licitatório em fase de conclusão para a Unidade de Pronto Atendimento do Sumarezinho.
Sandro Scarpelini reconhece que o tempo de espera por atendimento nas unidades de saúde tem sido maior do que o normal em função de um surto de virose. Contudo, isso não justificaria as agressões aos servidores. Atualmente o tempo médio de espera por atendimento passou a ser de três horas, para casos em que o diagnóstico inicial não é considerado urgente ou emergencial. Segundo a secretaria, casos graves continuam tendo prioridade.
Medidas de segurança
Para tentar minimizar o problema de falta de segurança, a secretaria instalou circuito de câmeras e alarmes nas unidades de saúde e para algumas contratou vigilantes. Também diz desenvolver trabalho preventivo junto aos gerentes das unidades e parceria permanente com o comando da Polícia Militar das respectivas áreas.
Outra ação que a secretaria julga eficiente foi a criação da Comissão “Saúde Mais Segura”. Por meio dela os profissionais envolvidos no desenvolvimento de estratégias em segurança nas unidades criaram uma cartilha sobre o tema. Ela tem dicas e cuidados relacionados à segurança nas unidades de saúde, além de prever a elaboração de um relatório semanal de notificação e acompanhamento dos casos de violência.
Para o presidente do Sindicato dos Servidores Municipais de Ribeirão Preto, Laerte Carlos Augusto, o grande problema na saúde de Ribeirão Preto é resultado da falta de valorização dos trabalhadores e do pouco investimento para melhorar as condições de trabalho dos profissionais e a qualidade dos serviços oferecidos para a população. “É preciso mudar isso e é o que temos lutado para conseguir”, diz.
Raio X da Saúde entre 2018 e 2019
Total de servidores que deixaram a Secretaria
385 servidores estatutários, administrativos e municipalizados
Áreas com mais desligamentos
109 na área de Enfermagem
98 na área Médica
178 diversas áreas
Motivos que causaram os desligamentos
305 aposentadorias
61 exonerações
13 remoções para outros setores
5 falecimentos
1 demissão por justa causa
O que a secretaria tem feito para suprir estas baixas
Solicitação de reposições e aberturas de concursos
Unidades que mais registraram ameaças aos servidores
Unidade Básica de Saúde da Vila Albertina
Unidade Básica e Distrital do Quintino II
HC suspende cirurgias
O Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto (HCRP) tem cancelado cirurgias por causa da falta de anestesistas. A redução estaria sendo provocada pelos pedidos de demissões de profissionais do setor e pela não reposição por meio da realização de concursos públicos. De acordo com a categoria, somente em abril, em torno de 90 cirurgias serão canceladas. O problema não seria recente e não se restringiria somente a anestesistas.
Em nota, o HC confirma que reduziu o número de procedimentos depois que seis anestesistas deixaram o hospital e que a situação já foi comunicada ao Estado. “As reposições estão em tramitação nos órgãos técnicos governamentais. A retomada do volume cirúrgico será realizada tão logo se obtenha a reposição desses profissionais”, informou.