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O enfraquecimento da Lava-Jato

Durante a sua triunfante trajetória, à Lava-Jato tudo foi permitido: foi possível condenar um ex-presidente sem provas, grampear e divulgar ilegal­mente conversa da presidente da República etc. etc.

A operação pôde agir sem freios, empurrada pela grande mídia, enquanto o seu alvo prioritário foi o Partido dos Trabalhadores. Basta dizer que, apesar das inúmeras provas, nenhum tucano foi preso enquanto Moro reinou desde Curitiba. A operação Mãos-Limpas atingiu os quatro grandes partidos da Itália. A Lava-Jato, ao contrário, agiu de modo seletivo, com o fim político de interromper o projeto de centro-esquerda iniciado em 2003.

Mesmo após a derrubada, também ilegal, da presidente Dilma, a Lava- Jato continuou a navegar em águas tranquilas. O noticiário continuava a lhe ser amplamente favorável, o STF e os tribunais superiores persistiam em seu laissez-faire em relação à operação. Lula ainda não havia sido preso…

Mas Lula foi preso, Bolsonaro se tornou presidente e o juiz Moro, fun­cionário de Bolsonaro, de acordo com o presidente da Câmara. A Lava-Jato atingia o seu ápice.

Mas, o infame acordo da Lava-Jato com o Departamento de Justiça dos Estados Unidos, que destinou, em troca do repasse de informações confidenciais da Petrobras aos EUA (inclusive informações comerciais), 2.5 bilhões de reais da companhia ao manejo dos procuradores, foi suspenso pelo STF, a pedido da procuradora-geral da República, que assim o qualificou:

“Caracteriza grave violação dos princípios constitucionais estruturantes do modelo republicano e democrático, pautado no sistema de freios e contrapesos.”

Mais. Frente a autoproclamação da Lava-Jato em juízo universal, o STF também ofereceu uma resposta, ainda que muito tardia. Apesar de o suposto triplex de Lula e da sede da Petrobras não ficarem em Curitiba; apesar da ausência de conexão, segundo o próprio Moro, entre a aquisição do triplex e quaisquer dos contratos da Petrobras, a 13ª Vara de Curitiba foi quem julgou o caso.

Pois bem, o STF agora determinou que os crimes de corrupção conexos aos crimes eleitorais são de competência da Justiça Eleitoral, o que estreita o raio de ação da Lava-Jato e o que pode resultar na anulação de diversos processos. Os procuradores, bem como os deputados e militantes bolsonários, convocaram um protesto contra o STF que fracassou completamente.

A Lava-Jato contra-atacou: mandou prender Temer e Moreira Franco. Que tanto um quanto outro são corruptos contumazes há mais do que ele­mentos. Agora, é certo que essas prisões não se enquadram nas hipóteses do art. 312 do CPP. Ilegais, portanto.

Temer e Moreira foram libertados, e a cobertura da imprensa não foi uma blitzkrieg, um linchamento público, mas deu, ao contrário, amplo espa­ço à tese da ilegalidade das prisões.

O que ocorreu entre as prisões de Lula e Temer, entre os efusivos aplau­sos da grande mídia unidos ao apoio dos tribunais ao arbítrio da Lava-Jato no primeiro caso frente à crítica e à desconstrução no segundo?

Não creio que seja uma “reação do cansaço” como recentemente escreveu Jâ­nio de Freitas na Folha. Trata-se antes de uma disputa entre as forças políticas das classes dominantes. Até a prisão de Lula, o inimigo comum unificou essas classes e seus representantes políticos. A força da Lava-Jato residia precisamente nessa uni­dade, em ser um instrumento para pôr fim ao projeto reformista liderado pelo PT.

Cumprida a tarefa, abriu-se um período de disputa entre os partidos an­tipopulares para a divisão do butim, do poder político usurpado. Nessa cisão, a Lava-Jato se associou a uma das correntes, a do bolsonarismo. Logo, contra as demais, que, por seu turno, possuem raízes profundas seja no Estado, seja na imprensa. Note-se que a explosiva prisão de Paulo Preto (do PSDB) se deu somente após essa associação.

O destino da Lava-Jato está – como sempre esteve – condicionado pela evo­lução da luta política no país. Alguma das tendências em luta prevalecerá? Será possível um acordo? Se associar ao bolsonarismo não parece muito alvissareiro.

Certa feita, o filósofo Ivan Karamazov, do romance de Dostoievski, disse que“um réptil devora outro réptil”. De todo o modo, deixemos que os répteis se entredevorem.

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