Tribuna Ribeirão
Esportes

Jovens atletas do Brasil aproveitam habilidades para conseguir bolsa e morar fora

Por João Prata

O volante Henrique Gallina estava nas categorias de base do Palmeiras, já havia deixado muitos concorrentes para trás e caminhava no rumo certo para se tornar jogador de futebol profissional. Faltava dar o último passo, quando o funil estreita ainda mais e só uma pequena parcela de fato chega lá. Nas conversas com os pais e os amigos, com a dúvida na cabeça do “e se não der certo aqui?”, descobriu a possibilidade do intercâmbio esportivo, mercado em ascensão no Brasil e que tem transformado o plano B dos jovens em plano A.

Em 2018, aproximadamente 3 mil adolescentes aproveitaram suas habilidades esportivas e conseguiram bolsa de estudos além da fronteira, 20% a mais do que no ano anterior. Os dados são da Belta (Associação de Agências de Intercâmbio do Brasil). O número é pequeno, 1%, se comparado aos 364 mil brasileiros que deixam o País apenas para estudar fora. O futebol, de acordo com Ricardo Raposo, dono da agência EI Brazil, é o carro-chefe. Sua empresa já embarcou mais de 500 brasileiros. Mas também há procura por modalidades como natação, basquete, vôlei e tênis. 

Maura Leão, presidente da Belta, acredita que o crescimento no intercâmbio acontece por uma conjunção de fatores. “Tem a questão da violência no Brasil, a qualidade no ensino, a oportunidade de aprender uma nova língua e, no caso do esporte, conciliar o estudo com a prática em alto nível”, disse.

Henrique tinha bom inglês, excelente currículo no futebol e obteve vaga na University Of South Florida, em Tampa, nos Estados Unidos. O garoto de 19 anos deixou a cidade de Atibaia, no interior de São Paulo, e completou dez meses longe do País. Recentemente, gravou um vídeo da faculdade, um misto de centro de treinamento do Real Madrid com salas de aula da Apple. “A conexão cultural me surpreendeu. Nosso time tem atletas de oito países”, contou ao Estado.

Com Elio Lago, de 21 anos, promissor jogador de tênis, a história foi um pouco diferente até embarcar. Com uma bagagem cheia de troféus, treinando no Centro Olímpico de Fortaleza, sua cidade natal, ele procurou a agência de Raposo. O inglês ainda não era dos melhores. “Mostramos para ele as oportunidades que já existiam e falamos que poderia melhorar. Sugerimos dar um passo atrás e aprimorar o idioma.” 

Seis meses depois, o garoto obteve bolsa no curso de marketing em uma faculdade nível 1, as mais concorridas, dos EUA, em Lafayette. O estudo, que poderia custar US$ 50 mil (cerca de R$ 195 mil) por ano, ficou por US$ 3 mil (R$ 12 mil), incluindo a moradia no câmpus e alimentação. “O suporte que eles dão para o atleta é muito alto. Tem muita gente por trás te ajudando a chegar ao topo”, diz.

PRÉ-REQUISITOS – Estudar fora do País e entrar para o time da universidade não é tarefa das mais difíceis. Mas conseguir um bom desconto no curso por causa da modalidade praticada não é tão simples. As primeiras regras são óbvias e fundamentais. “É preciso ter um talento acima da média para ser selecionado. E se preparar para os testes de proficiência (TOEFL e SAT)”, explicou ao Estado Ricardo Raposo, dono da EI Brazil e formado em administração em Miami graças ao dom de jogar futebol.

Depois desses dois primeiros passos, a agência de intercâmbio vai até as universidades apresentar o currículo escolar, a nota da prova de inglês e um vídeo do candidato praticando sua modalidade esportiva. “As bolsas podem chegar a 100%, mas isso não acontece na maioria dos casos”, disse Raposo. 

A universidades enviam as propostas e a agência auxilia o candidato na escolha. Após a definição, é necessário conseguir o visto de estudante. “Neste momento, a família deve comprovar que tem condições de arcar com custo da ida e permanência do aluno”, disse Raposo. Concluído o processo, o aluno é autorizado a embarcar. Na chegada, é recepcionado por alguém da instituição onde estudará. Na maioria dos casos, vai morar no câmpus da universidade. 

LUCRO – Os donos das agências de intercâmbio esportivo no Brasil, no geral, são profissionais que também viveram a experiência de morar fora. A vida de atleta universitário facilita o contato com técnicos e jovens de outros times e acaba sendo o primeiro passo para o começo do negócio. Raposo fez faculdade em Miami, montou sua agência e já conseguiu vagas para mais de 500 estudantes fora. 

Gustavo Machado, de 26 anos, sócio da MVP Exchange, começou da mesma maneira. Ele viu a carreira de jogador de futebol acabar depois de quatro cirurgias no joelho, e inovou no novo negócio. Normalmente, as agências sobrevivem de taxa única cobrada do aluno, que varia entre R$ 8 mil e R$ 10 mil. Algumas outras agências cobram valor de monitoramento. 

A MVP criou nova fonte de renda. Em parceria com academias, oferece período de treino antes do intercâmbio e aulas de inglês online. Já são duas filiais em São Paulo, 180 alunos e a expectativa até o fim do semestre de abrir outras três: Atibaia, Alphaville e Salvador. As aulas custam entre R$ 150 e R$ 400. “Tentamos não excluir ninguém porque há universidades para todos os perfis. De alto nível e para quem quer conciliar estudo e esporte”, explicou Machado.

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