Monteiro Lobato escreveu muito e, não só para crianças. Ativista que era, ensaiou em “Urupês” e mostrou sua mágoa em relação ao racismo em “O Presidente Negro”, afora crônicas voltadas à política do petróleo. Em um de seus ensaios, teceu comentários a respeito da nudez de uma árvore. Não me recordo se era mangueira, ipê ou jequitibá, se bem que, por sua experiência secular de vida, devido à sua exuberância e beleza, o jequitibá não mereça ser tratado simplesmente de “uma árvore”.
Preocupa-se Monteiro Lobato, referindo-se aos cafezais – veja caro(a) leitor(a), outrora houve cafezais – quando neles era deixada uma única árvore nativa ou não, talvez servindo de referência no meio da plantação.
Poeticamente, preocupava-se com a intimidade dessa árvore que ao ser observada solitária, erguendo-se no meio de arbustos, sensível, sendo vista de todos os lados, a todo instante, sem direito de privacidade, era comparada a uma dama que se via arrebatada em seus segredos e na sua intimidade, procurando, talvez, com uma toalha, esconder o corpo nu, enroscando-se no tecido, envergonhada, tentando por todas as formas esconder-se dos olhares intrusos.
Quando li o texto pela primeira vez, não houve maiores preocupações, até o momento em que, observando uma árvore esquecida em um pasto, vieram-me à memória as palavras e sensibilidade de Monteiro Lobato.
Pelos idos das décadas de 30 e 40 do século passado e início dos anos 50, inclusive com apoio governamental, a ordem era desmatar. E o autor, de forma velada e sublime, já denunciava as atitudes impensadas e voltadas a um desenvolvimento não sustentado e depredador do meio ambiente.
Hoje, em meio às plantações, dificilmente encontramos uma solitária árvore nativa. No entanto, se a encontrarmos, fiquemos atentos e observemos. Quem sabe seja possível ver na copa e no tronco de uma única árvore que tenha sobrevivido ao exacerbado plantio, aquela sensação de timidez emanada pela solidão desnuda que de repente é interrompida por olhares que não da espécie!
Não bastasse, nas margens de nossos rios também ocorrem raros exemplos como esse, uma ou outra árvore sobrevivente da mata ciliar repentinamente flagrada desnuda a tocar delicadamente suas raízes em águas outrora piscosas e cheias de vida, envergonhada às observações, tímida por estar só, temerosa pelo seu futuro, ao ser olhada, me parece uma dama nua procurando cobrir-se, enroscando-se em si mesma, porém, nada podendo fazer…
Lembrar Monteiro Lobato e tentar poeticamente traduzir um sentimento e uma recordação são gratificantes. Não é gratificante, no entanto, a figura solitária e esquecida de uma única árvore no meio a arbustos, ou a debruçar-se nas águas de um rio, que envolta nos mistérios de sua solidão, mal serve de apoio às aves que nela procuram abrigo e, no amargor do silencio de sua espécie, chora por ser apenas uma única árvore!