O Fundo das Nações Unidas para a Infância, o Unicef, que está há muitos anos no Brasil e participa de inúmeros movimentos em defesa dessa frágil faixa etária, apurou que seis entre cada dez jovens de até dezessete anos são pobres. Essa constatação partiu de um novo método para aferir a pobreza. Não é apenas uma questão de falta de dinheiro. Leva em consideração a privação de seis garantias básicas: educação, informação, trabalho infantil, acesso à água, saneamento e moradia.
São 53,7 milhões de brasileiros nessa categoria da população. Destes, 32,76 milhões, ou 61%, encontram-se na condição de privados desses bens mínimos de uma existência digna.
Dinheiro, portanto, não é a única dimensão da pobreza. A miséria tem várias faces. E não é constatação empírica, fruto do “achismo” que ainda é tão frequente em nossa Pátria. Foram dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD, do IBGE, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística os utilizados pelo Unicef para chegar a esse quadro dantesco.
Dantesco, sim. Nem o inferno de Dante, com a narrativa das desgraças particulares de inúmeros pecadores, ostenta um cenário em que milhões de crianças e jovens de uma Pátria que se diz cristã e humana, estão praticamente abandonados. A mesma Pátria que assiste ao circo de horrores de políticos corruptos, aliados a negociantes inescrupulosos, que saqueiam o Erário e privam o futuro de gerações preparadas e prontas aos desafios da 4ª Revolução Industrial.
Falta tudo para essas infelizes criaturas. Renda per capita de até R$ 346 mensais na zona urbana ou R$ 269 na zona rural. Estão submetidos a uma privação monetária evidente e constituem um quinto – 6 milhões – dentre os considerados pobres.
O dobro desse recorte – 13,33 milhões de jovens – não têm saneamento básico. Vivem a realidade deprimente de banheiro compartilhado por mais de uma família ou com fossa rudimentar. Aquela que alimenta a horrenda poluição da água potável que é a mesma para beber, para uso doméstico, para higiene e para a manutenção da precária roça de subsistência.
Educação é fictícia para 8,79 milhões de afetados. 7,6 milhões não têm acesso à água. 6,8 não dispõem de informação. 5,89 milhões não têm moradia e 2,52 milhões estão desprotegidos e convivem com trabalho infantil incompatível com a idade imprópria para o enfrentamento do labor contínuo.
Enquanto isso, o Estado inflado cria mais municípios, mais cargos, mais funções. Fala-se na falta de investimento, mas o único investimento que vale a pena fazer é aquele que contempla o ser humano.
Não há verdadeiro desenvolvimento, não existe progresso, a não ser o crescimento de cada pessoa, em plenitude, para que todas as criaturas da espécie que continua a se considerar racional, a despeito de tudo isso, possa provar que há um trajeto rumo à perfectibilidade. Ninguém pode aspirar a ser melhor se passar fome, se viver sem cultura, sem higiene, sem saúde e, principalmente, sem respeito daqueles que se propõem a administrar a coisa pública.
Enquanto a capacidade de indignação não renovar a face da política partidária, dela banindo os que não se mostram dignos de representar o povo sofrido, não haverá futuro para esta Nação que fulmina as novas gerações, impedindo que elas desabrochem.
Crime pelo qual responderão. Mas isso não conforta os que têm fome e sede de Justiça.