O ribeirão-pretano Antônio Palocci Filho, ex-ministro da Fazenda e da Casa Civil dos governos petistas de Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010) e Dilma Rousseff (2011-2016), respectivamente, quer voltar a ser consultor de negócios. Condenado pela Lava Jato a nove anos e dez dias de prisão em regime domiciliar por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, o ex-prefeito de Ribeirão Preto confessou ter usado a empresa Projeto Consultoria, da qual era dono, para camuflar milhões de reais provenientes de propinas.
Agora, espera autorização da Justiça Federal para voltar a trabalhar. Segundo amigos, Palocci pretende auxiliar empresas na área de compliance, termo que define a adoção de boas práticas de gestão empresarial, entre as quais o não envolvimento em casos de corrupção, e que virou termo da moda depois das prisões de grandes empresários pela força-tarefa de Curitiba (PR).
No dia 29 de novembro, pouco depois de deixar a prisão em Curitiba para cumprir pena em regime domiciliar, em São Paulo, Palocci pediu autorização ao juiz Danilo Pereira Júnior, da 12ª Vara Federal de Curitiba, para poder trabalhar enquanto cumpre a sentença. “O trabalho não é negativo. Tenho certeza que o senhor pensa assim também”, argumentou Palocci.
“Não quero passear, não quero nada”, completou o ex-ministro, em tom de brincadeira. O juiz negou o pedido sob a alegação de que ele ainda não está no regime aberto. Enquanto isso, o ex-ministro vive com ajuda financeira da família. Seu irmão, Pedro, é um grande empresário da área da saúde em Ribeirão Preto, chegou a ser investigado pela Lava Jato mas não foi indiciado porque nada de errado foi encontrado.
No apartamento de 500 metros quadrados em São Paulo, avaliado em R$ 12 milhões – e bloqueado pela Justiça –, Palocci mantém alguns hábitos adquiridos nos mais de 800 dias de prisão. Entre eles o de cultivar mudas de frutas. Na cadeia, o ex-ministro plantava as sementes das frutas que consumia e presenteava os parentes dos colegas de cárcere com as mudas. Foram mais de 400. Outro é a leitura. Palocci está lendo “Macunaíma – O herói sem nenhum caráter”, de Mário de Andrade, e “Tipos Psicológicos”, de Carl G. Jung.
A carga horária de exercícios físicos caiu de três horas diárias na cadeia para uma hora e meia. Na prisão domiciliar, o ex-ministro pode receber visitas, desde que não tenham ligação com os processos da Lava Jato, mas não pode sair de casa sem autorização judicial. Ele é monitorado durante 24 horas por dia por meio de uma tornozeleira eletrônica.
Na audiência do dia 29 de novembro, Palocci foi advertido pelo juiz sobre a importância de manter o equipamento sempre com a bateria carregada. “O não carregamento do equipamento nos impede de monitorá-lo. Para nós, isso é uma fuga eletrônica, é a mesma coisa que o senhor tivesse pulado a grade da penitenciaria e fugido”, disse o magistrado.
Na manhã de 25 de dezembro, dia de Natal, um plantonista em Curitiba percebeu que a tornozeleira estava descarregada e procurou em vão os advogados de Palocci. A situação só foi resolvida às 8h40, quando o sistema de monitoramento mostrou que o dispositivo foi recarregado.
Palocci dormiu na casa da Lagoinha
Na semana passada, o ex-ministro Antônio Palocci recebeu autorização para pernoitar na casa na qual morou no bairro da Lagoinha, em Ribeirão Preto, na volta de Brasília, onde prestou depoimentos durante três dias e fechou mais um acordo de delação – o terceiro. Desde o início de dezembro o ex-ministro pede autorizações para visitar a mãe, Dona Toninha, de 84 anos. Sua defesa entregou os comprovantes de endereço e o plano de viagem à Justiça. “Por oportuno, esclarece-se que os comprovantes estão em nome do requerente pois, em que pese sua genitora lá resida temporariamente, o imóvel pertence a Antônio Palocci.”
Toninha não viu a chegada do filho, na quarta-feira à noite, mas foi preparar o café da manhã para ele no dia seguinte. Depois voltou para o apartamento onde mora, no Jardim Paulista, em São Paulo, dirigindo um Polo prata. A passagem de Palocci pela cidade que o elegeu prefeito duas vezes foi cercada de segredo. No PT de Ribeirão Preto, ninguém ficou sabendo.
“Não tinha a menor ideia disso. Ninguém comentou nada em nenhum dos grupos (de WhatsApp) do PT”, disse o presidente do diretório municipal do partido, Fernando Tremura. O jornalista Galeno Amorim, que presidiu a Fundação Biblioteca Nacional nos governos petistas, foi encontrar Palocci, com quem tem uma relação próxima há mais de 20 anos, para falar sobre a publicação do livro que o ex-ministro escreveu na prisão.
Segundo quem tem conversado com o ex-ministro, Palocci registrou reflexões sobre os mais de dois anos que passou na carceragem da Polícia Federal em Curitiba, os erros do PT e os dele próprio “de forma franca”, além de revelações sobre os anos em que foi um dos homens mais poderosos do Brasil e seus principais personagens.
Palocci encara o livro como uma “obrigação” de abordar em profundidade as três delações que já firmou com a Polícia Federal e o Ministério Público Federal. A amigos, confidenciou que as colaborações revelam 40 fatos relevantes, a maior parte ainda inédita, e disse que a Lava Jato, enquanto instrumento de mudança da Justiça, “está só começando”. Entre as revelações está uma conversa com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na qual teria orientado o correligionário a comprar o triplex do Guarujá que motivou sua prisão. Lula teria recusado.