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Nosso último boêmio se mandou

Havia anos que rolavam no meio musical notícias de que Caburé es­tava nas últimas – e até que já havia morrido. Era um tal de ligar pra conferir que não tinha fim, até que na segunda-feira, 26 de novembro de 2018, logo de manhãzinha, recebi o zap de seu sobrinho Jacaré dizendo em apenas duas palavras a derradei­ra notícia: “Caburé zerou…” Como bom boêmio, deixou pra se mandar na madrugada da segundona.

De imediato, fiz uma prece pedindo aos amigos músicos que já estão no andar de cima que o acolhessem com cuidado, pois partira muito enfermo. Tratei logo de noticiar o ocorrido e o mundo musical se preparou para dar o último adeus a Caburé.

Passei o dia relembrando tantos momentos prazerosos que tive em sua companhia… Eu o conheci nos anos 60, quando ele formou o conjunto The Rebs e eu tinha o conjunto Os Tropicais. Onde o The Rebs ia tocar, nós, músicos iniciantes, rodeávamos Caburé para aprender acordes que ele inventava com maestria. Devemos muito a este mestre das cordas mágicas.

Caburé, sempre evoluindo musicalmente, passou a ser asse­diado por muitos cantores famosos. Diziam que o violão, em suas mãos, só faltava falar. E lá foi ele mundo afora fazendo aquilo que gostava e que Deus deu-lhe o dom. Gozava da companhia de fazendeiros endinheirados, políticos que o colocavam em aviões levando-o para outros estados só para mostrar sua arte –até o presidente Figueiredo virou seu fã de carteirinha.

A amigos que o visitavam, suplicava que não queria tristeza em seu velório, que ela fosse substituída por música e que amigos músicos cantassem e tocassem seus instrumentos. Pois bem. Na segunda-feira lá estava França da Escaleta, seu companheiro de intermináveis madrugadas – tive o privilégio de, por sorte, estar em algumas delas, era sempre um show e sempre acontecia algo diferente na música que eles executavam. Quem viu, viu, pois como naquelas noites não acontecerá mais.

No velório, Dani do Cavaco cantou velhos sambas de Nelson Cavaquinho para homenagear o amigo. Pereira, velho parceiro de boemias, harmonizou deliciosos chorinhos executados por França. Enfim, a nata musical se fez presente, mas o ponto alto das homenagens foi quando, emocionados, os músicos tocaram “Choro pro Caburé”, composição do saudoso maestro Horvildes Simões em homenagem ao amigo.

Na rua Américo Brasiliense, na esquina com a Marcondes Sal­gado, hoje tem uma loja que comercializa produtos para skatistas e outros esportes. Pois bem, esta esquina abrigou, por algum tempo, o bar “A Volta do Boêmio”, frequentado pela nata da bo­emia da cidade e da região e cujo dono era Caburé. Fazendeiros fãs do artista montaram este bar e deram de presente a ele para que pudesse faturar algum e ser o dono de seu negócio. Foi bem até certo ponto, mas Caburé não nasceu pra ser dono de nada, não tinha tino comercial e a boemia ficou sem mais um reduto onde pudesse jogar conversa fora e cerveja dentro. Nosso Caburé voltou a ser o que sempre fora, um artista popular.

Muito já escrevi aqui no nosso Tribuna sobre o amigo que se mandou, mas encerro com um pedido que ouvi ele fazer ao então vereador e radialista Dácio Campos. Quando gravávamos o CD “Gente cá da terra”, estávamos jantando quando Caburé, rindo, soltou essa: “Dácio, eu sei que quando eu morrer, vocês vão dar meu nome a uma rua, mas eu não quero ser nome de travessa, não, quero ser nome de uma rua, uma rua bem comprida, bem grande ou quem sabe serei nome de avenida, já pensou? Avenida Caburé…” A mesa toda caiu na gargalhada e a resenha seguiu. Estamos esperando que seu desejo de ser nome de rua se realize.

Até mais ver Caburé.

Sexta conto mais.

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