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Milton Carlos, o Rei e o show na cadeia

Hoje, manuseando antigos CDs, encontrei um do saudoso cantor e compositor Milton Carlos – nasceu em 13 de novem­bro de 1954, em Sampa, e faleceu em 21 de outubro de 1976 –, que foi embora cedo, com apenas 22 anos, vítima de um acidente de trânsito no quilômetro 57 da Rodovia Anhan­guera, em Jundiaí. Estava com a noiva e colidiu o carro na traseira de um caminhão.

Velhas recordações começaram a martelar em minha cabeça, até porque quando ele surgiu, senti certa repulsa, pois eu era mega fã de Roberto Carlos e ter mais um artista com o sobrenome Carlos ficava uma parada meio que repetitiva. O tempo foi passando, fui tomando conhecimento de sua obra e daí passei a admirá-lo. Canto até hoje “Memórias do Café Nice” e “Samba quadrado”, dois lindos sambas lentos de sua autoria.

Milton Carlos é irmão de Izolda, compositora de primeira, e vejam como são as coisas: Roberto Carlos gravou belíssimas canções dos dois irmãos. Por exemplo, é de Izolda a música “Outra vez”. Quando perguntam ao Rei qual música ele não compôs, mas gostaria de ter composto, sem titubear ele vai logo dizendo: “‘Outra vez’, de Izolda”.

Roberto Carlos sempre se prestou a ajudar os mais neces­sitados, tanto que conheceu Nice, sua primeira esposa, numa creche onde, às vésperas do Natal, foi oferecer ajuda e ela estava lá pelo mesmo motivo. Tiveram dois filhos.

Eu estava num show dele, na Cava do Bosque, aqui em Ribeirão Preto, e fiquei de cara com a atenção dada por sua equipe aos cadeirantes, colocando-os bem ali na fila do gar­garejo, cercando-os de mimos, coisas de se admirar. Ainda sobre Roberto Carlos, vou contar uma história acontecida faz muitos anos. O Rei estava hospedado no Black Stream, pois tinha show à noite na cidade.

Onde hoje fica o 1º Distrito Policial, ali na rua Duque de Caxias, naquela época era cadeia e muitos presos cumpriam pena nas celas, era um tempo de crimes não tão violentos como hoje e o delegado, muito gente boa, teve a ideia de ir até o hotel pedir ao Roberto Carlos se ele poderia cantar para os presos. O Rei disse: “Vou sim. A que horas devo estar lá?”. O delegado não esperava uma resposta positiva como esta e, refeito da surpresa, ambos combinaram o horário. E RC Braga foi.

O doutor abriu as celas, colocou os presos sentados em círculo no chão do pátio e Roberto Carlos cantou pra uma inédita plateia que, incrédula, assistia a tudo emocionada. Os detentos jamais poderiam imaginar um privilégio como este.

No Clube de Regatas, conversando com um amigo sobre música, ele revelou ter sido muito amigo de Milton Carlos e que foi várias vezes com ele, de Fusquinha, para o Rio de Ja­neiro. Ambos davam o maior plantão, às vezes de dois dias e duas noites, em frente à casa do Roberto esperando o Rei sair a fim de lhe entregar fitas K7 com composições de Milton.

Até deram sorte, pois agindo, conseguiram chamar a atenção do ídolo, que diante de tanta insistência levou e ouviu as fitas, gostou de algumas canções e gravou-as, como “Jogo de damas” e “Elas por elas”. Quando passo pelo quilômetro 57 da Via Anhanguera sempre reverencio a memória de Milton Carlos e até agradeço pelo que fez por MPB de qualidade.

Sexta conto mais.

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