A quinta e derradeira cirurgia para separação das irmãs siamesas Maria Ysabelle e Maria Ysadora, de 2 anos, que nasceram unidas pela cabeça, está sendo realizada neste sábado, 27 de outubro, Desde às sete horas da manhã no Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto – vinculado à Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP).
A operação envolve 30 profissionais. Até uma emissora de televisão da Inglaterra vai acompanhar o procedimento, inédito no Brasil. A expectativa é que esta seja a intervenção mais demorada, e deve levar entre dez e 20 horas, segundo o neurocirgurgião Ricardo Santos Oliveira.
O procedimento é tão minucioso que a equipe envolvida na separação das gêmeas já fez até “simulados”. “Reproduzimos o ambiente da cirurgia, a disposição do material, as funções delegadas a cada participante, quais serão os passos seguinte à separação. Estamos confiantes. O primeiro procedimento será revisar tudo o que foi feito nas quatro etapas anteriores”, diz Oliveira.
Segundo Oliveira, esta última operação tem quatro etapas. “Primeiro, vamos revisar e complementar o que já foi feito na parte interna, checar se não há mais nenhuma veia, nenhum vaso unindo as meninas. Depois vamos trabalhar na reconstrução da membrana cerebral (dura máter), da estrutura óssea e do couro cabeludo”, explica.
No pós-operatório, as meninas permanecerão mais tempo na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) Pediátrica do que após as cirurgias anteriores – a primeira foi realizada em 17 de fevereiro e durou sete horas. A mais recente, a quarta, ocorreu em 24 de agosto e levou cinco horas. A próxima vai começar logo no início da manhã e só deve terminar entre a noite de hoje e a madrugada deste domingo (28). As gêmeas vão ficar mais tempo sob o efeito de anestésicos.
A terceira etapa, realizada em 4 de agosto, durou oito horas. O neurocirurgião Hélio Rubens Machado afirmou que 80% dos cérebros, veias e artérias das irmãs siamesas já foram separados. “Isto só foi possível porque avançamos nas etapas anteriores, além do planejado dentro do limite de segurança”, explica Ricardo Santos Oliveira. Todos dizem que a “evolução das meninas é surpreendente”.
O chefe da Divisão de Cirurgia Plástica do HC, Jayme Farina Junior, disse, após a quarta cirurgia, que os médicos implantaram quatro expansores subcutâneos para dar elasticidade à pele e garantir que, na separação total de corpos (a próxima fase), haja tecido suficiente para cobrir os crânios. Os expansores são espécie de bolsinhas de silicone e foram implantados nas têmporas, nuca e na testa das meninas.
Após 15 dias, a equipe começou a enchê-las com soro fisiológico com o objetivo de fazer a pele esticar. Não chega a dobrar de tamanho, mas ganha em torno de 30% da área que tem agora. “Então, a gente consegue cobrir uma área maior, depois da última cirurgia. As válvulas ficam embaixo da pele, em quatro lugares diferentes. Cada expansor tem uma válvula”, afirma. A cirurgia contou com uma equipe de profissionais liderados pelo Farina Junior.
As irmãs siamesas serão definitivamente separadas um mês antes da previsão inicial (final de novembro). As meninas têm cérebros independentes, mas com áreas de vascularização interligadas. São esses vasos sanguíneos que foram separados em cada das cirurgias realizadas até agora. Trinta profissionais de diferentes áreas estão envolvidos neste processo, entre eles o médico norte-americano James Goodrich, referência mundial no assunto. Até o molde de silicone foi produzido para ajudar os médicos nas cirurgias.
Todo o processo de separação das irmãs só está sendo possível por causa de uma parceria entre a Faculdade de Medicina da USP e o Montefiore Medical Center de Nova York, Estados Unidos. A primeira cirurgia foi realizada em 17 de fevereiro e a segunda, em 19 de maio. Segundo os médicos, as meninas se alimentam, respiram, se comunicam e têm desenvolvimento normal, como qualquer criança da idade delas.
Trajetória de luta
Naturais do distrito cearense de Patacas, distante 35 quilômetros de Fortaleza, as irmãs siamesas Maria Ysabelle e Maria Ysadora, estão sendo acompanhadas por uma equipe multidisciplinar do Hospital das Clínicas. Entretanto, a luta dos pais das meninas para separá-las começou no Ceará, com o neurocirurgião pediátrico Eduardo Juca. Ao tomar conhecimento do caso das irmãs, alguns meses após o nascimento delas, ele passou a fazer o acompanhamento médico das meninas.
Em função da complexidade do caso, decidiu encaminhar as duas para o Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto, onde ele estudou. Jucá foi aluno da Faculdade de Medicina da USP Ribeirão Preto e se especializou neurocirugia pediátrica. Todo processo de separação das meninas é custeado pelo Sistema Unificado de Saúde (SUS). Nos Estados Unidos, um processo de separação como o delas custa cerca de R$ 9 milhões.