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Já não chegamos ao caos?

O sociólogo e especialista em comunicação Manuel Cas­tells, publica “Ruptura” pela Zahar, com a mensagem apro­priada para os dias que vivenciamos no Brasil. Tempos de incerteza, de insegurança e de ausência de perspectiva. Tudo já visto, tudo já dito, tudo já mastigado, digerido e vomitado.

A esperança de alguns é o surgimento de nova ordem. Para estes poucos otimistas, “aposta-se no surgimento dessa nova ordem de uma nova política que substitua a obsoleta democracia liberal que, manifestamente, está caindo aos pedaços em todo o mundo, porque deixa de existir no único lugar em que pode perdurar: a mente dos cidadãos”.

A crise crônica, o que é um paradoxo, assume o polimor­fismo: “A subversão das instituições democráticas por caudi­lhos narcisistas que se apossam das molas do poder a partir da repugnância das pessoas com a podridão institucional e a injustiça social; a manipulação midiática das esperanças frus­tradas por encantadores de serpentes; a renovação aparente e transitória da representação política através da cooptação dos projetos de mudança; a consolidação de máfias no poder; a pura e simples volta à brutalidade irrestrita do Estado em boa parte do mundo”.

Por fim, salienta Castells, “o entrincheiramento no cinis­mo político, disfarçado de possibilismo realista, dos restos da política partidária como forma de representação. Uma lenta agonia daquilo que foi essa ordem política”.

A ruptura da relação entre governantes e governados é ca­ótica e particularmente problemática no momento em que se questiona a habitabilidade deste planeta, a partir da própria ação dos humanos e de sua incapacidade de aplicar as medi­das corretoras, de cuja urgência ninguém pode alegar incons­ciência. É o superdesenvolvimento tecnológico e o subdesen­volvimento político e ético, em ritmo veloz ladeira abaixo.

O desespero da falta de perspectivas talvez seja a tábua de salvação para que o ser humano, cada criatura provida de lucidez, aja com humanidade. Mediante a capacidade de autocomunicação, deliberação e codecisão de que agora se dispõe na “galáxia internet”, é cuidar de si e de sua família, na tentativa de reconstruir o tecido de nossas vidas, no plano pessoal, familiar e social.
Sem esperança de que partido algum responda aos de­safios urgentes, acreditar na utopia de um caos criativo, “no qual aprendamos a fluir com a vida, em vez de aprisioná-la em burocracias e programá-la em algoritmos. Dada nossa experiência histórica, aprender a viver no caos talvez não seja tão nocivo quanto conformar-se à disciplina de uma ordem”. De uma ordem carcomida, burocrática e falida, pode-se acrescentar.

Talvez o caos não seja tão ruim. Ou será que já não esta­mos nele?

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