Nas minhas andanças pelas estradas da vida, Deus me deu a oportunidade de conviver com artistas, cantores, jogadores de futebol, músicos maravilhosos e muita gente boa. Hoje quero dedicar minha crônica a um deles, Mario Zan, o “Sanfoneiro do Quarto Centenário”. Assim era conhecido nacionalmente justamente por ter composto, em 1954, “O Hino do Quarto Centenário de São Paulo”.
Até hoje, sanfoneiro que se preza tem de ter em seu repertório esta animada música, mas poucos sabem quem é o autor. Em 2006, a acordeonista Gilda Montans, esposa de meu amigo Maurício Montans, convidou-me para o evento que realizava todos os anos em sua fazenda, o “Encontro Nacional dos Acordeonistas”. Eu já havia conhecido lá o Dominguinhos, Osvaldinho do Arcodeon e outros bambas. Naquela vez, ela disse: “Buenão, vamos homenagear Mario Zan”.
Na época, eu era apresentador do programa Canta Ribeirão, na nossa TV Thathi, e não poderia perder a oportunidade de uma entrevista desse “naipe”. A surpresa que prepararam para o sanfoneiro deixou Zan super emocionado. Foram buscá-lo no hotel, cobriram o cara de carinho e atenção como se dá aos grandes astros, muitos mimos, etc.
Ele entrou no recinto em uma charrete super chique, com um lindo cavalo todo cheio de pompas e sob aplausos dos fãs tocou sua sanfona, conversou e depois de todas homenagens, concedeu-me um deliciosa entrevista à sombra de bambus gigantes que até hoje só vi naquela fazenda.
Antes da minha primeira pergunta, Zan disse, de forma muito simples: “Sabe, meu caro repórter, faz muito tempo que ninguém me entrevista e que também não faço shows”. E foi falando… “Ninguém me contratava mais, parece que esqueceram de tudo que fiz – e olha que muito fiz pela música brasileira. Além do ‘Hino do Quarto Centenário’, compus ‘Chalana’, ‘Ciriema’, ‘Nova flor’ e mais centenas de música lindas”, disse.
Um fã que assistia à entrevista perguntou o que ele achava da dupla Leandro & Leonardo ter gravado “Não aprendi dizer adeus”, uma música que mais da metade é plágio de “Nova flor”. Sorrindo, Mário Zan disse que a segunda parte inteirinha o compositor plagiou, só teve o trabalho de colocar letra. “Mas a música é minha e do Palmeira, da dupla Palmeira & Biá. Minhas filhas estão cuidando dos meus direitos autorais.”
“Esta música”, continuou, “tem centenas de regravações, até em japonês. O rei Roberto Carlos também a regravou.” Perguntei se era verdade que a sua linda “Chalana” foi realmente composta por causa da vista que uma janela de um casarão na cidade de Corumbá proporcionava.
Dali ele tinha a maravilhosa visão da paisagem do Rio Paraguai e suas chalanas. Ele disse que compôs “Chalana” em 1943 e que era um velho casarão, sim, que virou o Hotel Galileu. Também revelou ter voltado lá depois de 58 anos, e que por causa da sua música, a cidade de Corumbá sabiamente usa o hotel e sua janela como marketing para promover a cidade e que o quarto da famosa janela está lotado o ano todo. “É o mais caro, todo mundo quer dormir onde compus a música”. Aí ele deu uma tímida risada.
Disse que ainda morava na avenida São João, no Centro de São Paulo, próximo ao Cemitério da Consolação, onde cuidava do túmulo da Marquesa de Santos que estava abandonado. Revelou também ter comprado terreno ao lado, onde queria ser enterrado. Meses depois seu desejo foi realizado. Talvez esta tenha sido sua última entrevista. Sexta conto mais.