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Réu por estelionatos, recém-nomeado vice do Detran se filmou a 96 km/h

Por Luiz Vassallo

Em uma rodovia, um motorista filma o painel da própria Mercedes a 96 km/h, em meio à trilha da eletrônica e dançante “The Main Room Party” que toca no rádio. “Ah, seria na Imigrantes, e o limite lá é de 100 km/h”, diz à reportagem o condutor. Além de cometer irregularidades no trânsito, ele também acumula duas pendências com a Justiça Criminal. Em ambas, acusado pelo Ministério Público de estelionato.

Este é o recém-nomeado vice-presidente do Detran de São Paulo, pelo governador Márcio França nesta quarta-feira, 5. Após contato da reportagem, o governo afirmou que irá tornar o ato sem efeito.

Além do vídeo em que filma o painel de seu veículo de luxo a toda velocidade, Carlos Augusto Galier a expõe de outros ângulos em suas redes sociais. “Mas isso foi em 2015, tem mais de dois anos”, justifica sobre a infração considerada gravíssima pelo órgão para o qual foi nomeado.

Ele diz ter sido indicado ao cargo por “mérito”. “A gente tem o merecimento, entendeu? E, como estava muito afastado para mim, onde eu estava trabalhando, em Ibiúna, onde tenho casa e escritório de advocacia, para mim fica mais viável em São Paulo. O que deu para encaixar foi isso daí”.

No Instagram e no Facebook, Galier também mostra fotos com amigos – entre eles, um ex-BBB -, em festas, baladas e na academia, onde exibe os braços tatuados.

Foi malhando os músculos que Galier se envolveu, em uma de suas ocorrências policiais, registrada no 1º DP de Taboão da Serra, na Grande São Paulo. À época, em 2016, era delegado do Procon em Ibiúna, interior de São Paulo.

A suposta vítima, Maurício Tadeu Sales, disse ter ouvido um boato na academia que frequentava segundo o qual estava na mira da Polícia por fraude ao seguro. Ele diz que pediu a Galier, que teria se apresentado como delegado, para que averiguasse sua situação. De acordo com Sales, causava temor o fato de que fora indenizado pelo seguro após registrar Boletim de Ocorrência pelo roubo de seu antigo automóvel.

Segundo Sales, o recém-nomeado vice do Detran teria dito a ele que, de fato, era investigado, porque a polícia tinha em sua posse dois CDs nos quais continham imagens que provavam que seu carro não estava no local do suposto roubo.

Por motivo que não quis esmiuçar às autoridades, Sales disse ter topado uma exigência de Galier para fazer “morrer” a investigação: pagar R$ 25 mil a dois policiais.

A suposta vítima diz ter dirigido até a delegacia junto de “Caca”, como era apelidado Galier, e que o recém-nomeado do Detran entrou no local e voltou com uma foto sua e o número do Boletim de Ocorrência afirmando que a investigação, de fato existia. A foto de Galier ficou registrada na portaria do DP.

Nas investigações, constam, além dos saques e de imagens de Galier na delegacia, um áudio em que uma voz atribuída a ele pelo Ministério Público e pela Polícia, fala sobre os valores com Sales. Já o recém-nomeado vice do Detran afirmou à Polícia que emprestou dinheiro a Sales e que queria recebê-lo de volta.

Ele disse que “pelo fato de Maurício acreditar que policiais estariam cobrando alguma quantia para deixar de dar continuidade e algum procedimento, viu ali a oportunidade de reaver os valores outrora emprestados para Sales e alimentou a história que este acreditava.

Ainda afirmou às autoridades que “deixou a entender que estavam pedindo dinheiro em troca de benefícios, se deu conta da besteira que fez, mas não tinha como voltar atrás”.

Para o Ministério Público, em denúncia oferecida em junho de 2016, Carlos Augusto Galier “indiretamente confessou os fatos imputados, posto que, afirmou que jamais se apresentou como delegado e jamais pegou qualquer quantia em dinheiro da vítima”. O processo está em fase de alegações finais.

À reportagem, Galier nega a acusação. “Esse é uma pessoa que não tem prova nenhuma. É uma coisa que é a palavra dele. Como a gente é meio político, as pessoas querem aparecer e envolver as pessoas para ficar famosas, entendeu?”

Em outra ação, o recém-nomeado vice do Detran é acusado de tomar R$ 20 mil de um casal. Segundo a Promotoria, ele “se apresentou a Maria Nazaré dizendo-se advogado, e ela e seu marido acabaram contratando-o para, em nome deles, renegociar uma dívida”. “Pagaram inicialmente a ele R$ 5 mil em espécie”. No cadastro da OAB, ele consta como estagiário.

“Posteriormente, o denunciado disse-lhes que renegociara a dívida com o credor, de modo que eles deveriam pagá-la em quatro prestações de R$ 5 mil cada uma, mediante depósitos bancários em favor de Leandro Santos Rosa”, diz o MP.

Segundo a Promotoria, antes do “quarto depósito, o advogado do credor ligou para Maria Nazaré cobrando-lhe a dívida; então, ela e o marido descobriram que tinham sido vítimas de um golpe”.

“Esse casal aí foi uma coisa que eu conheço a pessoa há 20 anos e ele tinha pedido uma coisa emprestada pra mim e não comunicou a esposa dele. A esposa dele não sabia o que tinha acontecido e de onde que ele tirou o dinheiro para me pagar. Temos total certeza da absolvição em relação a isso”.

A Secretaria de Estado do Planejamento e Gestão Pública do governo paulista informa que “Carlos Augusto Galier não possui nenhuma condenação definitiva, o que o faz apto para exercer a função nomeada, e atende à emenda à Constituição do Estado de São Paulo, que proíbe a nomeação em cargos públicos, conforme determina a lei”.

“Responder inquéritos ou processos não pressupõe que qualquer pessoa é culpada, antes do devido julgamento. O cargo estava vago há tempos e foi preenchido de acordo com a Lei”.

“Entretanto, o fato de fazer vídeo, e publicá-lo como exemplo, assim como mencionado na matéria, em que ele dirige, utilizando concomitantemente o celular, e fala para rede social, é absolutamente inadequado e incompatível com a postura esperada para um dirigente do Detran-SP, que por ser uma instituição de Fiscalização e Controle de Trânsito, deve ter dirigentes que demonstrem o exemplo de sua própria conduta, o comportamento ideal de quem fiscaliza”.

“Diante disso, para que sirva de exemplo a todos que são servidores públicos, em especial de quem tem a tarefa de comando, determinou o secretário da referida secretaria responsável pela nomeação, a imediata (7/9/18), publicação de insubsistência da nomeação, ou seja, revogando a nomeação do diretor Vice-Presidente do Detran-SP de dois dias atrás”.

“Não temos e não teremos nenhum compromisso com erros e reafirmamos compromisso com a qualidade do bom serviço público, prestado pela esmagadora maioria dos servidores públicos”.

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