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Prefeitura questiona 68 leis de vereadores

ALFREDO RISK

Entre janeiro de 2017 e junho deste ano, a Secretaria Municipal de Negócios Jurídicos da prefei­tura de Ribeirão Preto ingressou com 68 ações diretas de incons­titucionalidade (Adins) no Tri­bunal de Justiça de São Paulo (TJSP) – para anular leis apro­vadas pela Câmara de Vereado­res. Os processos questionam projetos aprovados em antigas e muitos são da atual legislatura, que vai até 31 de dezembro de 2020. No total, são 40 propostas elaboradas por ex-vereadores e mais 28 de parlamentares que estão no exercício do mandato (leia quadro nesta página).

Segundo o levantamento realizado pelo Tribuna, muitas das leis que estão sob questio­namento jurídico propõem so­luções até plausíveis de serem implementadas pelo município. Um exemplo disto é a nº 14.127, de 21 de fevereiro de 2018, que trata da instalação de sistema de segurança através de câmeras de vídeo, nas escolas municipais, unidades de saúde e em outros órgãos públicos.

Entretanto, por ter sido pro­posta pelo Legislativo, contém vício de iniciativa e está sendo questionada judicialmente. A argumentação jurídica é que apenas o Executivo tem poder para elaborar leis que gerem despesa. Além disso, quando a Câmara propõe medidas que mexam com o erário, tem de indicar a fonte de receita, sem comprometer o orçamento.

Para o presidente da Câmara de Ribeirão Preto, Igor Oliveira (MDB), as Adins representam a forma independente com que os poderes atuam pela cidade. “A maioria dos projetos são óti­mos, com mérito voltado para a cidade. Por isso o colegiado vem insistindo pelas aprovações. Tanto que, o Tribunal de Justiça têm considerado muitas dessas Adins improcedentes e dado ga­nho de causa favorável ao Legis­lativo”, garante.

No ano passado, o Órgão Es­pecial do TJSP recebeu 22 ações diretas de inconstitucionalidade contra a Câmara de Ribeirão Preto, movidas pela prefeitura após a promulgação pelo Legis­lativo de leis que haviam sido vetadas pelo prefeito Duarte Nogueira Júnior (PSDB). O nú­mero ficou 21,4% abaixo do de 2016, quando a Corte paulista recebeu 28 pedidos de revoga­ção – o maior montante dos úl­timos anos. Foram seis a menos.

Porém, algumas dessas propostas são resquícios da legislatura anterior que foram questionadas no exercício pas­sado. Em 2006, o Tribunal de Justiça deu o “bicampeonato” à Câmara de Ribeirão Preto por causa das leis inconstitucionais e emitiu um alerta para que os vereadores fossem mais cau­telosos ao apresentar projetos com vício de iniciativa, gerador de despesas e outros critérios.

No total, são 40 propostas elaboradas e aprovadas em plenário por ex-vereadores e mais 28 de parlamentares que estão no exercício do mandato

Negociação
Segundo especialistas em direito público consultados pelo Tribuna, uma solução para diminuir a elaboração de leis inconstitucionais seria a negociação direta do vereador com o Executivo. Na prática, significa que antes de elaborar uma proposta com potencial de ser alvo de Adin, o parla­mentar deveria conversar com o prefeito, mostrar que sua su­gestão é boa e convencê-lo a mandar um projeto de lei sobre o assunto para a Câmara.

Apesar de parecer um tra­balho complicado, esse tipo de convencimento não está tão distante da realidade como pode parecer. Na atual legislatura, o vereador Marco Antônio Di Bonifácio, o “Boni” (Rede), ne­gociou com o Executivo a cria­ção do Conselho Municipal de Esportes. Após ser orientado por seu departamento jurídico e pela Comissão de Constituição, Justiça e redação (CCJ) de que a proposta era inconstitucional, o parlamentar retirou o projeto e convenceu a prefeitura sobre a importância da lei.

Resultado: o Executivo en­viou para a Câmara um projeto semelhante ao proposto pelo vereador e o conselho foi criado pela lei municipal 2.812. “O me­lhor caminho é pontuar os pro­blemas, mas também dar a solu­ção. E é isso que eu tenho feito como vereador“, afirma “Boni”. Contudo, especialistas ressaltam que não é recomendável querer elaborar projetos como o que gerou a lei complementar nº 406.

Aprovada em 12 de de­zembro de 1994, a lei obriga a prefeitura a fornecer água po­tável para todos moradores de Ribeirão Preto, ainda que resi­dentes em favelas ou habitações irregulares. Apesar de ser poli­ticamente correta, a proposta é alvo de ação direta de incons­titucionalidade por ofender os princípios da legalidade, finali­dade, eficiência e razoabilidade do interesse público.

Muitos anos depois
Embora pareça estranho, o fato de que leis aprovadas em outras legislaturas ainda este­jam na mira da Secretaria de Negócios Jurídicos, anos após sua aprovação, tem explicação técnica. As Adins são ajuizadas no momento em que a incons­titucionalidade é detectada. Ou seja: na aplicação efetiva e prá­tica da legislação.

Por isso, nem sempre as datas da aprovação da lei e das Adins são coincidentes. Vale ressaltar que todas as ações de inconstitucionalidade foram im­petradas no Tribunal de Justiça de São Paulo, que tem jurispru­dência formada para analisar os pedidos de nulidade.

Adins entre janeiro de 2017 a junho de 2018
Ano de aprovação da lei             Total
1994………………………………….02
2004………………………………….01
2007………………………………….01
2011………………………………….01
2012………………………………….01
2014………………………………….01
2015………………………………….05
2016………………………………….28
2017………………………………….22
2018………………………………….06
Total………………………………….68
(Fonte: Secretaria Negócios Jurídicos)

‘População fica na incerteza’

Na grande maioria dos ca­sos, as proposituras apresen­tadas pelos vereadores atende ao interesse público, mas de­satende a competência legal para tratar de matérias feitas exclusivamente ao Executivo Municipal, nos termos pre­vistos na Constituição Fede­ral, Constituição Estadual e Lei Orgânica do Município.

Os vereadores e os mem­bros da Comissão Permanen­te de Justiça e Redação deve­riam agir com mais critério na apresentação de projetos de lei polêmicos e de duvidosa constitucionalidade, realizan­do estudos comparativos com a jurisprudência predominan­te do Tribunal de Justiça.

A iniciativa de projetos flagrantemente inconstitu­cionais, que posteriormente serão expurgados do mundo jurídico, não reflete a quali­dade da vereança e a produti­vidade dos vereadores.

O elevado e crescente nú­mero de Adins (Ações Diretas de Inconstitucionalidade) in­terpostas pelo Executivo Mu­nicipal acarreta insegurança jurídica no Município, pois a legislação municipal fica à mercê de decisões judiciais, com a concessão e cassação de medidas liminares, sentenças de mérito, recursos, etc.

É preciso que os setores organizados da sociedade e os munícipes em geral te­nham pleno conhecimento das leis municipais válidas e aptas a serem executadas e efetivamente obedecidas.

Não nos esqueçamos que a Câmara de Ribeirão Preto, há duas décadas, foi agraciada com o título de “Campeã Pau­lista de Leis Inconstitucionais”, justamente pela insistência dos vereadores em apresentar projetos de lei da alçada priva­tiva do Poder Executivo.

Enquanto o Poder Exe­cutivo e a Câmara Munici­pal travam essa disputa no Judiciário, a população fica na incerteza, sem saber ao certo quais leis municipais estão produzindo seus efei­tos legais e quais foram re­tiradas do mundo jurídico por vício de iniciativa.

Certamente, essa não é a melhor forma de exercer a ve­reança e aperfeiçoar a legislação do Município de Ribeirão Preto.

* Advogado com
especialização em
Direito Público

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