Tribuna Ribeirão
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Mitigar, adaptar e sofrer

Às vésperas do anúncio de um relatório anual do Painel Intergovernamental sobre Mudan­ça Climática (IPCC) – comitê de climatologistas das Nações Unidas –, o físico John Holdren, então presidente da Associação Norte Americana para o Avanço da Ciência, perguntado pelo The New York Times, sobre o que a humanidade poderia fazer em relação ao aquecimento global, respondeu: mitigar, adaptar e sofrer.

O jornal Folha de S.Paulo trouxe recentemente uma série de reportagens mostrando os impactos da mudança climática sobre a vida das pessoas e os desafios de adaptação à nova realidade. São nove capítulos de competente jornalismoambiental e de provas irrefutáveis do início de um tempo de maiores desafios para a humanidade. As matérias podem ser acessadas em folha.com/crisedoclima.

Migração do povo Guna – indígenas panamenhos – das ilhas caribenhas de San Blas para o continente, devido a subida do nível do mar. Pior seca do semiárido brasileiro que se tem registro – 2012/2017 – tornando a agricultura e o abastecimento público sofríveis no Nordes­te.

Infiltração, por derretimento do gelo, no Cofre Global de Sementes localizado em Longye­arbyen, Noruega, cidade mais ao Norte do planeta (78ºN), cujo objetivo é assegurar variedade genética de plantas para garantir a agricultura no futuro.Tempestades de fogo em proporção jamais vista por portugueses na região central do país, em meados de 2017, como resultado de temperaturas elevadas, baixa umidade do ar e vegetação seca, comprometendo a produção de azeitonas.Migração de aproximadamente 500.000 porto-riquenhos após a passagem dos furacões Irma e Maria em setembro de 2017, deixando o ambiente da ilha numa condição tão alterada que houve registro de borboletas diurnas circulando a noite em busca de flores inexistentes.Negacionista da mudança climática, meteorologista aposentado do INPE, contra­tado por empresas fabricantes de máquinas agrícolas, fertilizantes e agrotóxicos, para proferir palestrasa produtores rurais no Matopiba – região do cerrado brasileiro na confluência dos estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia –; nova fronteira da soja no país, cujos índices de pluviosidade já dão os primeiros sinais de queda.Derretimento da maior geleira andina no Peru, a Cordilheira Branca, colocando a cidade de Huaraz em permanente risco de tsunami por rompimento de lagoa glacial. O iminente “Dia Zero” na Cidade do Cabo, África do Sul, onde as represas têm níveis demasiadamente baixos dado a escassez de chuvas nos últimos anos, ao ponto de moradores abrirem as torneiras e não sair mais água. Ressacas mais fre­quentes e intensas na Baixada Santistae risco de erosão costeira em grau acentuado em mais da metade das praias paulistas!

Estação seca pronunciada. A nova condição climática em nossa região é nítida. Chuvas escassas a partir de meados de março e estiagem que se prolonga até novembro.Inverno mais brando com frentes frias menos úmidas. Aumento de queimadas em matas. Níveis baixíssimos de água em rios caudalosos com risco de não haver mais a piracema.Desaparecimento de nas­centes. Aumento na população de escorpiões. Incidência maior de doenças respiratórias…

O novo Plano Diretor de Ribeirão Preto prevê a elaboração do Plano Municipal de Mudan­ça do Clima – artigos 69 e 70 / LC 2866/2018. Para que não venha ser letra morta, o melhor que pode acontecer neste momento é não negarmos que as mudanças estão ocorrendo, o governo não dizer que tudo está sob controle, e a sociedade perceber e assumir que ela é parte do problema e também da solução.

Mitigar tem o sentido de diminuir.Há conhecimento científico e sabedoria de povos primitivos suficientes para nos ajudar a reduzir, ainda que parcialmente,os tantos problemas citados. Humildade perante a natureza – em oposição à arrogância de querer controlá-la a qualquer preço -, opções econômicas de baixo-carbono e solidariedade civilizatória são o tripé para o caminho da adaptação.

O sofrimento acompanha a humanidade em sua história na Terra. Na dimensão individual podemos nos fortalecer e irradiarmos discernimento e coragem.

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