A ação popular impetrada pelo professor Sandro Cunha dos Santos na 1ª Vara da Fazenda Pública de Ribeirão Preto, em conjunto com a advogada Taís Roxo da Fonseca, ambos ligados ao Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), ainda não tem decisão do juiz Reginaldo Siqueira, mas já suscita discussões e será questionada em esferas superiores caso a sentença atinja cerca de dois mil funcionários públicos da prefeitura, 20% do quadro de 9.988.
A incorporação classificada de “inconstitucional, ilegal e imoral” pelo Ministério Público Estadual (MPE), e que fez surgir os “supersalários” na Câmara de Vereadores, ligou o sinal de alerta no Sindicato dos Servidores Municipais de Ribeirão Preto (SSM/RP). Apesar de a ação inicial ter como alvo apenas o Legislativo, parecer do promotor Wanderley Trindade pede a inclusão da prefeitura como ré, pois a controversa manobra criada em 2012 foi aproveitada por centenas de servidores da administração para “turbinar” os vencimentos – ou aposentadorias.
O vice-presidente do SSM/RP, Alexandre Pastova, avisa que se os servidores efetivados (estatutários) antes de 2012 (data de aprovação da polêmica incorporação) forem prejudicados, a entidade irá à Justiça para defendê-los. “Não somos contra a ação em si, mas estamos preocupados com os rumos que ela está tomando”, comenta Pastova. A “aberração jurídica”, segundo os autores da ação, permite que funcionários possam incorporar aos salários originais os valores que receberam quando exerciam cargos em comissão.
Em seu parecer, o promotor Wanderley Trindade chama de “ilegal”, “inconstitucional” e de “manobra” a incorporação incluída na lei nº 2.515, de 2012. A emenda permitiu a servidores antes comissionados em gabinetes de vereadores, ao serem aprovados em concursos públicos para cargos de nível fundamental e salário de cerca de R$ 1,6 mil, engordar o holerite com os valores que recebiam quando eram assessores. Na Câmara de Ribeirão Preto, dezenas de aprovados em processos seletivos com remuneração inferior a R$ 2 mil já começaram a trabalhar com vencimentos acima de R$ 20 mil.
Mas não foram só os antigos assessores de vereadores que aproveitaram a brecha – centenas de funcionários da prefeitura também acabaram beneficiados. A lei permite que se incorpore ao vencimento 20% do que o servidor recebia no cargo de chefia a cada ano. Ou seja, quem, após 2012, na administração Dárcy Vera, ocupou por cinco anos um cargo de chefia, hoje recebe o antigo salário e mais o valor de quando esteve na chefia. Não se trata de receber o maior salário – recebe os dois somados.
Além da “aberração jurídica” inaugurada pela incorporação, o Instituto de Previdência dos Municipiários (IPM) – que paga aposentadorias e pensões – também foi onerado. Servidores estaduais, próximos de se aposentar, prestam concurso para a prefeitura de Ribeirão Preto – paga melhor do que o Estado, especialmente na educação e na saúde –, contribuem para o IPM por poucos anos e se aposentam.
Apesar desses servidores terem contribuído a maior parte de suas carreiras para o Estado, é o município de Ribeirão Preto que arca com a aposentadoria para o resto da vida. Não existe compensação entre os institutos – ou seja, o estadual não transfere para o município dinheiro que arrecadou de contribuição previdenciária de seu ex-servidor. Na ação que tramita na 1ª Vara da Fazenda Pública, autores e promotor pedem a suspensão imediata do pagamento da incorporação, tanto na Câmara quanto na prefeitura, e a devolução de todo o dinheiro recebido desde 2012, supostamente de forma ilegal.