A juíza da 2ª Vara da Fazenda Pública de Ribeirão Preto, Luísa Helena Carvalho Pita, concedeu liminar ao Sindicato dos Servidores Municipais (SSM/RP), suspendeu os efeitos dos contratos de gestão assinados pela prefeitura com a Fundação Hospital Santa Lydia e impôs multa diária no valor de R$ 100 mil em caso de desobediência da ordem judicial.
A magistrada vetou o que os sindicalistas chamam de “terceirização” nas Unidades Básicas Distritais de Saúde (UBDS’s) Doutor. João Baptista Quartin (UBDS Central, o popular Pronto-Socorro Central) e Doutor Sérgio Arouca (UBDS do Quintino Facci II, na Zona Norte) e na Unidade de Pronto Atendimento Doutor Luis Atílio Losi Viana (a UPA da Treze de maio, no Jardim paulista, Zona Leste).
A juíza Luísa Helena Carvalho Pita também deu prazo de cinco dias para que a Secretaria Municipal da Saúde reassuma a gestão dessas unidades. A prefeitura não foi notificada, por isso não pode comentar a decisão, mas provavelmente vai recorrer. Para a magistrada, o repasse dos serviços para a fundação é inconstitucional.
Batizado pelo governo Duarte Nogueira Júnior (PSDB) de “Programa Saúde Melhor”, a anunciada parceria com a Fundação Hospital Santa Lydia prevê a identificação dos pacientes com pulseiras. A classificação por cores preconiza o tempo mínimo de espera. Pulseira verde, uma hora e meia. Amarela, 30 minutos. Vermelha, cinco minutos. O não cumprimento de metas impactará em sanções administrativas e financeiras e até substituição de profissionais.
Os servidores efetivos (concursados) das UBDS’s e da UPA estão sendo transferidos para outras unidades e serão contratados cerca de 400 funcionários para suprir essa alteração. A prefeitura estima que tudo ficará pronto em até 90 dias. Constituída a partir de contrato de gestão, a administração dos recursos humanos, materiais em geral, medicamentos e contratos de apoio como raio-X, portaria, limpeza, alimentação dos pacientes, energia elétrica, água, uniformes, entre outros, ficará sob a responsabilidade da fundação.
Estão sendo chamados 107 novos profissionais concursados para compor o quadro da Secretaria Municipal da Saúde. O chamamento fortalecerá os atendimentos médicos especializados e agendados. Estão sendo convocados 30 médicos de clínica geral, 30 enfermeiros, 25 auxiliares de farmacêuticos e sete médicos de estratégia de saúde da família. No setor administrativo, serão contratados 15 agentes de administração.
Estes profissionais irão trabalhar na atenção básica, em unidades de saúde onde há déficit no atendimento à população, o que dificulta o desenvolvimento da qualidade dos serviços e cria a necessidade de pagamento de plantões extras para a cobertura de escalas. Além das contratações de profissionais no regime estatutário, a gestão das três unidades de saúde pela Fundação Santa Lydia permitirá a transferência de 65 funcionários da UBDS do Quintino Facci II, mais 110 da UBDS Central e 14 da UPA para outras unidades de saúde.
São médicos, enfermeiros, auxiliares e técnicos de enfermagem, farmacêuticos e agentes administrativos que reforçarão a atenção básica da rede saúde municipal em diversos setores da cidade que hoje estão deficitários. O repasse mensal à fundação, que hoje é de R$ 2,5 milhões para pagamento dos médicos do pronto-atendimento das UBDS’s, vai aumentar para R$ 5,65 milhões, alta de 126% e aporte de R$ 3,15 milhões.
De acordo com o secretário Sandro Scarpelini, a pasta não vai pagar mais caro pelo serviço que hoje é prestado por servidores efetivos, uma vez que no valor está incluso o custeio (energia elétrica, água, limpeza, medicamentos etc). Porém, no entendimento do Sindicato dos Servidores Municipais, a medida nada mais é do que a terceirização do gerenciamento e da administração de unidades de saúde, “incompatível com a concepção constitucional e legal do Sistema Único de Saúde (SUS)”.
Em sua decisão, a juíza Lúcia Helena Carvalho Pita destaca “que tal situação, em princípio, indica a possível transferência da execução de serviço público cuja prestação direta é atribuída ao município, o que – em tese, repita-se – violaria o disposto nos artigos 199, §1º da Constituição da República e 24 da Lei nº 8.080/90”.
Segundo a magistrada, os artigos “preveem, de maneira expressa, que a atuação da iniciativa privada na assistência à saúde se dará apenas em caráter complementar e observadas as normas de direito público, não decorrendo daí, ao que tudo indica, a possibilidade de se atribuir ao particular o desempenho do próprio fim a que se destina o referido serviço, tudo a determinar, pelo que se pode aferir por ora, nesta fase de cognição não exauriente, repita-se, a possível invalidade dos referidos atos”.
O presidente do sindicato, Laerte Carlos Augusto, considera que a liminar não representa apenas mais uma vitória do SSM/RP em defesa dos trabalhadores e do serviço público. Para ele, “a decisão judicial mostra que a saúde da população ribeirão-pretana não é uma mercadoria cuja produção pode ser terceirizada”.
A coordenadora da Seccional da Saúde do Sindicato dos Servidores Municipais, Débora Alessandra da Silva, vice-presidente do Conselho Municipal de Saúde de Ribeirão Preto, também comemorou a decisão judicial. “Eu vejo que a saúde pública brasileira está sob ameaça de privatização. Em Ribeirão Preto, em defesa do SUS, fizemos a nossa parte”.