Murilo Bernardes
No dia 4 de dezembro de 2011 despedia-se deste plano um dos maiores nomes que o futebol mundial viu: Sócrates Brasileiro Sampaio de Souza Vieira de Oliveira, o “Doutor Sócrates”.
Pelos nuances da vida, seu passamento foi do jeito que ele sempre desejou. Num domingo e com o Corinthians campeão. Naquele fatídico dia, o Timão, então comandado por Tite, empatou em 1 a 1 com o Palmeiras no Pacaembu e faturou o título do Campeonato Brasileiro.
No último sábado (4), a morte de Sócrates completou uma década. Às pessoas próximas fica o sentimento de saudade, lembranças e grandes histórias proporcionadas pelo convívio com uma mente que estava à frente do seu tempo.
Aliás, esse é um dos pontos mais destacados pelas pessoas mais próximas do ex-jogador, que também fez história fora das quatro linhas, sendo um dos expoentes positivos de um momento catastrófico da política brasileira.
Em entrevista exclusiva ao Tribuna, Sócrates Júnior, um dos filhos do Doutor, falou sobre os 10 anos sem o pai e ressaltou a falta que ele faz, por não poder estar presente em momentos importantes da sua vida.
“São 10 anos sem ele. Foi muito triste, muito duro, não só a data, mas todo o processo. Ele ficou muito tempo no hospital, então passamos a ficar mais próximos e isso foi bastante duro. Eu sinto muita falta de poder compartilhar esse momento tão importante da minha vida, quando ele morreu eu tinha 21 anos, estava saindo da faculdade e não tinha a menor ideia do que ia fazer da vida”, afirmou Júnior.
“Eu tenho muita vontade de compartilhar com ele as coisas que estou fazendo, queria muito entender como ele enxergaria essas coisas, porque ele sempre foi um cara com uma visão muito diferente de mundo, revolucionária. Ele sempre esteve acima de qualquer superficialidade. Ele enxergava a sociedade de uma forma diferente”, completou.
Ver o mundo de uma maneira diferente foi uma das principais características de Sócrates, confidenciadas em histórias contadas por um de seus grandes amigos em vida, o cantor e compositor Bueno. Para ele, o que mais faz falta é a companhia.
“Companhia é o que mais faz falta. Ele era impressionante. Ele me pedia muitas coisas e eu pedia muitas coisas pra ele. Quando ele ia comprar uma coisa, às vezes pedia para eu ir na frente porque senão mudava o preço. Era uma relação espiritual. Nós fizemos juntos mais de 50 músicas, menos de 60, ele nunca me deixou contar qual a quantidade certa, mas é mais que 50 e menos que 60”, contou Bueno.
Dentre as histórias relembradas em meio às lágrimas, Bueno se lembrou de uma, que o marcou, e mostra bem quem foi Sócrates.
“Uma vez estávamos num bar e um catador de recicláveis viu o Sócrates e ficou olhando pra ele como se tivesse vendo um monumento. E o Sócrates chamou ele pra se sentar na mesa com a gente. O cara não acreditava que era com ele. O cara sentou e disse: Doutor, não acredito, como que eu encontro você aqui, eu pegando latinha, sou muito seu fã. O Magrão deu um abraço no rapaz e ele ficou com a gente na mesa. Foi muito legal ver isso”, relembrou.
A passagem retratada por Bueno é apenas uma dentre as muitas que ele e quem conviveu com Sócrates pôde presenciar. Para Júnior, isso é o que mais representa seu pai, o legado que ele deixou.
“Eu não tive uma relação de pai para filho tradicional com ele. Nunca tivemos uma vivência de dia a dia tão grande, mas era uma relação de muita referência, admiração e muita troca. Nesse sentido de visão de mundo, ele me influenciou muito”, disse.
“Hoje, depois de tanto tempo, fica o sentimento de orgulho e de querer levar esse legado para frente. Eu e meus irmãos estávamos conversando sobre isso, um projeto bastante amplo, de construção de legado dele, em breve a gente vai dar mais dicas sobre isso, mas posso adiantar que tem muita coisa legal por vir. Estamos tentando se reconectar com ele dessa forma, para fazer com que a mensagem que ele passou durante a vida seja eternizada”, completou o filho, que não revelou maiores detalhes sobre o projeto mencionado.
“Quem joga fácil tem o dom da rebeldia.
Em cada passe o prazer da serventia”, diz a letra da musica “Dom”, de Edvaldo Santana, que descreve bem em poucas palavras o que foi e quem foi Sócrates. Um atleta que encantou, reivindicou e serviu todos àqueles que tiveram o prazer de tê-lo ao lado.